Proibição de pagamento em dinheiro por horas extras no tribunal mineiro não impediu grupo de servidores de ganhar mais do que ministros do STF com o benefício adicional

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Contrariando resolução da própria corte do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG), cerca de 900 servidores da Justiça inflacionaram seus salários com horas extras, que consumiram R$ 2,31 milhões em remuneração extraordinária no período de apenas 15 dias. A Resolução 908, de novembro de 2012, estabeleceu plantões de apenas três horas e meia diárias por servidor e veda o pagamento em dinheiro do tempo trabalhado, autorizando somente a compensação por meio do banco de horas. Mas o que se viu foi o pagamento de até 10 horas diárias para cada um dos 870 servidores em dezembro, no período de 20 a 31, e para 717, entre 2 e 6 de janeiro. Na prática, o trabalho extraordinário superou em até três vezes o expediente autorizado.

O gasto de dinheiro público pode ser dimensionado com base no pagamento feito a quatro funcionários da cúpula do TRE-MG, que receberam valores acima do teto salarial de R$ 28.059 dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). O assessor jurídico da diretoria-geral do tribunal, Hamilton José Rodrigues de Lima, recebeu R$ 15.237,18, referentes a horas extras somente no período de 20 a 31 de dezembro. Somaram-se a isso R$ 7.484,60, referentes ao período de 2 a 6 de janeiro, totalizando R$ 22.721,78. O valor, de acordo com dados do próprio TRE-MG, é duas vezes maior que o salário base do servidor: R$ 11.156,95. Considerando ainda outros benefícios, além de um terço de férias e a antecipação de metade do 13º salário pago em janeiro pela Justiça Eleitoral, o vencimento bruto de Hamilton José chegou a R$ 65.539,78 (R$ 52.943,96 líquidos), quase duas vezes o salário dos ministros do Supremo.

Mas Hamilton não está só. Sua chefe, a diretora-geral do TRE-MG, Elizabeth Barra, que autorizou os pagamentos, recebeu pelo expediente extraordinário de fim de ano R$ 19.214,37, referentes a 62 horas e 31 minutos de horas extras. O salário dela, considerando direitos adquiridos e o cargo em comissão, chega a R$ 29.637 e sofre um desconto de R$ 687,08, para não ultrapassar o teto do funcionalismo. No entanto, como as horas extras não são incluídas no cálculo do teto, o vencimento bruto de Elizabeth em janeiro foi de R$ 62,11 mil, considerando acréscimo de R$ 13.361 referente a antecipação do 13º.

DESPACHO A autorização para o pagamento das horas extras partiu do presidente do TRE-MG, desembargador Antônio Carlos Cruvinel, que presidiu também a sessão da corte, autora da Resolução 908. As regras estabelecidas à época receberam o aval do procurador regional eleitoral, Eduardo Morato Fonseca, e foram publicadas no Diário do Judiciário Estadual, em 30 de novembro, e republicadas em 3 de dezembro. No entanto, apenas 15 dias depois da publicação, o desembargador Cruvinel deu um despacho autorizando o pagamento das horas extras, sob o argumento de que foi informado pela Secretaria de Orçamento e Finanças do TRE-MG que “houve previsão orçamentária para a realização do serviço extraordinário pelos servidores durante o recesso judiciário”.

No despacho, o presidente diz que a autorização se tornava viável em razão de ofício do diretor-geral do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de 29 de novembro, informando a abertura de créditos suplementares em favor do TRE de Minas, sendo que entre eles estava uma suplementação específica para pagamento de pessoal ativo da União no valor de R$ 2,08 milhões. Segundo o presidente, a despesa no recesso também estava prevista na Proposta Orçamentária, em tramitação no Congresso, o que justificava a autorização. O despacho, porém, não menciona a limitação do expediente em três horas e meia determinada pela corte eleitoral.

OFÍCIO Além da diretora-geral do TRE-MG e de seu assessor jurídico, o secretário de Gestão Administrativa, Felipe Alexandre Santa Anna Mucci Daniel, a secretária de Gestão de Pessoas, Gessy Rodrigues Rosa, e ainda a secretária de Orçamento e Finanças, Maria Leonor Almeida Barbosa de Oliveira Santos, receberam horas extras num valor alto, respectivamente, R$ 25 mil, R$ 17 mil e R$ 20 mil. Em ofício, encaminhado à diretoria geral, o secretário Mucci Daniel alega que “houve um aumento de trabalho com a proximidade do encerramento do exercício financeiro”. “As despesas e atividades em processamento decorrem do acúmulo de trabalho no período eleitoral. É que a concentração de esforços naquele período trouxe represamento de atividades que agora sofreram aumento vertiginoso. Diversas despesas estão sendo propostas, há procedimentos licitatórios em andamento e a quantidade de processos em trâmite aumentou sobremaneira”, diz o secretário no documento.

Nos mesmos termos, a secretária de Gestão de Pessoas, Gessy Rodrigues, também encaminha ofício à diretora-geral para pedir autorização para prestação de serviços extraordinários em seu setor. No entanto, ela foi mais específica, ao requerer que o pagamento das horas extras fosse feito em dinheiro, para alguns servidores do seu setor. “Solicito, ainda, autorização para a prestação de serviço extraordinário, no referido período, por esta secretaria, com retribuição em pecúnia, e em escala de revezamento”, diz o documento, que em seguida nomeia escalados para o trabalho. No período, Gessy recebeu R$ 17.121 pelo tempo extraordinário de trabalho.

Memória

Punições no TSE

Em janeiro, a presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, exonerou o diretor-geral da instituição, Alcidez Diniz, e da secretária de Controle Interno e Auditoria, Mary Ellen Gleason Gomide Madruga, em razão do pagamento de horas extras a servidores durante o período eleitoral. Somente em novembro, Mary Ellen teria recebido R$ 26 mil pelo trabalho extraordinário. De acordo com dados do próprio TSE, em novembro a Justiça Eleitoral foi obrigada a desembolsar R$ 3,8 milhões para 567 funcionários que alegaram ter dados expediente fora do seu horário de trabalho.

FONTE: Estado de Minas.